A chuva caiu
de uma maneira assustadora para quem passara a semana debaixo de um sol digno
de verão carioca. Eu subi no metrô apressado; corri pelas ruas da Zona Sul até
chegar à primeira estação visível. Não estava de casaco quando sai do trabalho,
apesar de ter um na mochila. Desci a escada rolante, passei na roleta, entrei
no metrô. O ar gelou meus braços ainda molhados da chuva e coloquei o casaco,
tentando tirar dele todo o peso das recordações que trazia. Eu havia feito uma
viagem com alguém; voltei do Peru sem ninguém, mas, com aquele casaco. Balancei
o, amassado da mochila, e me permiti relaxar. O metrô deveria estar bem mais
cheio do que estava realmente e me perdi nas lembranças do dia a dia maçante e
cansativo.
O metrô parou
e abriu numa estação que eu não me recordo e entraram dentre todos os outros,
três meninas, completamente encharcadas. As gotas da chuva caiam pelo rosto de
uma delas contornando seu sorriso grande e sincero. Ela era linda e pude ouvir
seu nome quando sua amiga o disse, Ana. Era o nome de minha mãe e passei a me
sentir muito responsável por ela. Talvez fosse o amor batendo as portas, sempre
fui um garoto tímido, mas sempre tive muita facilidade em me apaixonar. Ela era
linda e estava tremendo de frio agora. Decidi tomar a decisão mais impulsiva da
minha vida e olhei pra ela, ela me olhou de volta. Eu toquei seu ombro, sorri
com toda a graça que podia, e perguntei se ela queria meu casaco. Aquele casaco
tão cheio de memórias póstumas agora tinha um novo objetivo: Aquecer, ou
tentar, aquele ser perfeito em suas roupas molhadas e em bater de dentes. Seus
olhos expressaram a gratidão mais sincera que eu poderia receber daquela
proposta e ela o recusou. Disse que eu era fofo, que tipo de adjetivo era esse
e o que significava eram indagações que não
tinham respostas.
Eu desci do
metrô antes dela e me despedi apenas com um sorriso preso no olhar. Não queria
ir, quis dizer a ela o quanto eu queria que ela ficasse com casaco, o quanto eu
queria esquecer-me de pegá-lo porque talvez assim, nos víssemos de novo. Mas
não disse, eu fui embora apenas com a lembrança daquela menina.
P.S: Esse texto é dedicado à
minha grande amiga Ana Clara