Hora de ir embora, finalmente, depois de um dia sem muita ação no CTI pediátrico. Eu cansada estava pela semana intensa e pelas noites mal dormidas. Enquanto tirava o jaleco pra ir pra casa, sobem duas crianças, duas novas vagas cedidas. Coloquei o jaleco de novo e fui ajudar. Nem tanto como eu gostaria, o internato é cruel as vezes. Escolhi ficar perto de um menininho, 2 anos, chorava muito e queria mãe. Normal, quem não ia querer. A mãe havia descido pra resolver questões burocráticas da internação. Era uma Insuficiência Respiratória, quanto mais ele chorava, pior ficava. Fizemos as coisas mesmo assim, porque precisávamos tratá-lo. Fiquei ao lado dele, tentando não atrapalhar mais que ajudar.
De luvas e capote comecei a acariciar sua cabeça; ele continuava a chorar. Eu falei: "olha aqui pra tia" - ele olhou. "Vamos respirar: cheira uma flor e sopra uma vela". Ele fez, enquanto chorava ainda, mas foi fazendo. Já estava mais calmo quando as médicas residentes vieram colher um exame de sangue necessário. Só de ver os tubinhos ele voltou a chorar. Olhei bem pra ele e perguntei se ele queria que eu cantasse. Ele disse que sim. E eu fui desenterrar da minha memória afetiva a música que minha mãe cantava pra eu dormir, todas as noites. Ela diz assim: "cativar é amar, é também carregar, um pouquinho da dor, que alguém tem de levar". Ele gostou da música. Resmungou um pouco enquanto colhiam o sangue, mas dormiu. Ele dormiu enquanto o furavam pela segunda vez pra colher a gasometria.
Depois fiquei pensando, a gente estuda tanto sobre escala de dor, sobre analgésicos potentes, sobre bloqueadores neuromuscular, etc, e essa criança só precisou de uma música como conduta analgésica. Nada contra os medicamentos, pelo contrário, eles são extremamente necessários e bem indicados em muitos casos, mas, de vez em quando, a gente precisa lembrar o que um dia acalentou os nossos próprios corações pra fazer o mesmo com os outros.
Que coisa linda! Você é encantadora! Deus continue a te abençoar!!!
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