segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Janela



            Fui até a janela experimentar minha dose diária de luar e de um céu escuro nem tão estrelado quanto o esperado. Tudo era igual à noite anterior; os mesmos carros e prédios perdidos na imensidão de prédios e carros do subúrbio carioca. Deixei-me ser carregada pelas reflexões de um dia turbulento e cansativo. Como consequência, meu olhar se esvaiu na grandeza das nuvens abatidas que destoavam o azul escuro da noite. Fiquei assim por alguns minutos até que as luzes do prédio vizinho me chamaram atenção. Havia algumas delas acesas, mas em apenas uma existia um homem. Parado, imóvel. Olhei algumas vezes antes de garantir que não era um boneco ou algo do tipo.  Talvez estivesse me olhando com a mesma intensidade que eu o olhava, não saberia dizer.  Poderia ser qualquer um, poderia ter qualquer vida que eu quisesse imaginar. Primeiro pensei na possibilidade de ser, obviamente, meu grande amor. Não havia inspiração suficiente.
           Então pensei que talvez ele pudesse ser o amor de outro alguém. Ela não estava ali, onde ela estaria? Longe, tão longe que o simples ato de encarar a noite o fazia lembrar-se do imenso mundo se comparado ao seu ínfimo amor. Na verdade, seu amor era ínfimo apenas se comparado a isso. No que diz respeito às muitas outras comparações, ele era em tudo maior. Talvez, ambos perderam-se na vasta imensidão do próprio amor. Ele olhava as (poucas) estrelas imaginando que ela as olhava também. Ela assim não o fazia. Ao contrário, estava em casa, dentro dela, trabalhando quando não devia para nunca olhar as estrelas. Ela não poderia.
                Ele não sabia disso. Alguém chegou ao quarto, alguém o abraçou, o beijou. Senti-me mal pela menina. O que havia acontecido com o vasto amor? Perdeu-se em si. Estava ofendida demais para continuar na janela. Um amor finito é ruim se vivido na realidade; se, no entanto, é vivido na fantasia é ainda pior. Fui dormir, cansada das minhas desconstruções, torcendo para que não sonhasse.  


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