terça-feira, 7 de julho de 2015

Antes do quê?

     Escutei uma buzina no fundo de um pensamento vago e distante, percebendo só então que a realidade havia sido trocada por aquele mesmo pensamento. Eu que antes me via num mundo de realizações, a mais doce utopia, agora me via sendo puxada por aquele som tão nostálgico, de certa forma, ao que chamam de mundo real. Repetiu-se; mais demorado, agudo e justificado por uma luz que refletiu o verde dos mais belos pastos. Era também verde, um tipo de sinal, sim, era esse o nome. Eu enfim olhei ao redor e notei que estava dentro do carro, do mesmo carro de antes. Antes – antes do quê? Talvez fosse depois, depois do sonho. Tentava fazer o carro andar quando mais uma vez escutei aquele barulho enlouquecedor que vinha provavelmente de alguém impaciente. Impaciência palavra que descrevia o estado de espírito de cada ser no mundo fora do sonho. O que era sonho ou realidade eu já não sabia. Durante aqueles poucos minutos eu pude ter alegria de sentir a realidade como a utopia e vice versa.
        Vaguei pela cidade como se fosse a primeira vez depois de anos sem notá-la. Tentava captar suas luzes e abri as janelas pra sentir o seu vento. Fechei os olhos mesmo sabendo que não podia e por um momento estive de volta lá, na utopia mais doce. Ouço mais uma vez o barulho, o mesmo de antes. Vejo-me voltando a abrir os olhos, como se estivesse desligando alguma coisa, do jeito mais demorado possível. Quando enfim os abro já nada mais via além de luzes tão próximas e nada mais ouvia além da buzina. Acordei, pensava eu. Não, estava enganada; eu dormia, só não sabia.
         O barulho cessara, a luz não. Ainda refletia em meus olhos, podia senti-las mesmo quando ainda ponderava na possibilidade de não os abrir.  O cheiro não era bom e aos poucos, como minha visão turva, voltei a sentir meus membros. Olhei ao redor e preferia fechá-los novamente, voltar de onde eu vim. No entanto, não era possível, aquele era o fim dos meus desvios de realidade frequentes. Aprendi da pior maneira, do jeito mais doloroso. Chorava, não pela dor física, mas, por estar ali abrindo mão da realidade que eu queria. Fechei os olhos e voltei a ela mais uma vez, desejando não deixá-la. Escutei uma buzina no fundo de um pensamento vago e distante, percebendo só então que a realidade havia sido trocada por aquele mesmo pensamento.     

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