segunda-feira, 11 de maio de 2015

Comunicação não-verbal



Parecia um ambiente agradável, mas não me senti à vontade quando sentei na cadeira. Eu havia chegado cedo demais e a banda ainda nem começara a tocar. Eu ouvi o  trompetista afinando seu instrumento quando o garçom perguntou se eu queria alguma coisa; uma água, eu disse. Ele a trouxe quase instantaneamente, eu agradeci. O piano iniciou uma melodia detalhista, concentrada, que eu conhecia pelo nome. O cantor não cantava com a autenticidade do King Cole, mas, a melodia era gostosa e fez lembrar-me de quando meu pai me rodopiava pela sala nos seus pés. Fui interrompida por um sorriso estupidamente largo e bruto, seguido por uma mão gentil pousada em frente a mim; ele a estendia de forma simples e ágil, como se fizesse o mesmo ato todas as noites. Ele falou alguma coisa enquanto eu estava perdida nas minhas observações; eu balancei minha cabeça.
Fui puxada pelas mesmas mãos e logo percebi que tinha aceitado uma dança. Não havia ninguém dançando, fomos os primeiros. Ele me conduzia de forma agradável: A brutalidade das mãos não combinava com seus paços suaves. Ele não era autoritário; propunha o passo e cabia a mim segui-lo ou não. Eu sempre o fazia, claro, por dois principais motivos: minha falta de inclinação e talento para qualquer atividade motora, e o seu olhar era singelo demais para que eu o recusasse assim. Talvez eu encontrasse o amor ali, me via apaixonando-me a cada balanço da dança. Seus braços envolviam minha cintura e eu sentia seu respirar quente e úmido no meu pescoço. Aquilo me fez esquecer o real motivo da minha vinda ali. Enquanto ainda rodopiava pelo salão, uma segunda mão tocou meu ombro, quase não a senti, ela era franzina, negligente e conhecida.
Pedi licença ao meu parceiro de dança e segui aquelas mãos até uma mesa. Trocamos algumas palavras e eu tirei da bolsa o anel, ainda quente do uso. Entreguei-lhe deixando ali qualquer magoa dos meses passados, um noivado terminado e a tristeza da perda. Sorrimos um para o outro, ele pegou minha mão e a beijou, dizendo naquele gesto que um dia disse olá, um adeus sincero e melancólico. Ele havia partido e eu me via sucumbir em lágrimas quando senti novamente as brutas mãos no meu ombro. Eu sorri, agradeci e dancei o resto da noite.

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