sábado, 6 de junho de 2015

Cecília

       Cecília, Cecília - eu gritei sem parar - Onde ela está? Dormindo, imagino eu. Minha cabeça ainda dói das duas noites não dormidas e eu caminho ainda com a visão turva do último sonho, cambaleando pelos corredores do apartamento recém decorado. Por alguns minutos eu esqueço a ordem dos quartos, mas logo lembro, quando vejo o quadro que eu mesmo pintei na porta branca e nova. Ouço o ranger quando a abro e tenho medo de perturbar talvez o seu sono. Lá está ela, no berço, dormindo com a serenidade que eu tanto preciso.
      Com o tempo, as pessoas dizem, fica mais fácil. Espero que não, a beleza da vida está no que não é. Não que seja difícil contemplar seus olhinhos fechados  à espera da próxima necessidade; difícil é parar. Não é complicado acalmar seus choros desanimadores e desgastantes na calmaria do meu peito; difícil é achar que ela encontre conforto ali, aqui. Lembro de muitas vezes vagar meu coração pelo mundo, trazendo na lembrança momentos distintos e possibilidades futuras - viajar sem sair do lugar; mente de artista, me diziam, você é poética demais, eu sempre soube. No entanto, a cada dia se torna difícil me desprender daqueles dedinhos que apertam os meus e do coração que domina o meu. Não existem outros lugares, não existem outros sonhos: uma vez na vida minha mente poeta diz que eu estou exatamente onde eu deveria estar. 
    Como crescer mais, como ser maior do que naquele momento?  Como pode tanta pureza ser feita de mim assim - é a graça de Deus, me dizem, e eu acredito. Cecília agora ninava em meus braços, e por mais que já estivesse dormindo continuava a melodia que outrora minha mãe cantava. "Cativar é amar, é também carregar um pouquinho da dor que alguém tem de levar". Cecília já aprendia sobre o amor, Cecília já sentia o meu por ela, o meu por ele. 
-Vocês estão bem? - uma voz sonolenta se dirigia. 
-Sim, fala pro papai Cecília - eu disse. 
   Ela esboça um daqueles sorrisos, minhas pernas estremecem e eu choro. Sinto um abraço acolhedor e sussurros gentis ao pé do ouvido. Somos os dois consumidos pela emoção e choramos pela perfeição da Cecília. Lágrimas e sorrisos, penso eu. A vida naquele instante era perfeita, quase tanto quanto Cecília. 

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