Peguei-me mais
uma vez sendo esvaída pela vida. Não que escrever não fosse mais prioridade,
ainda é. Às vezes a vida é tão complicada de ser vivida que não nos sobra tempo
para observá-la do jeito que ela merece, quanto mais para descrevê-la. No
entanto, fui parada bruscamente pela única coisa que me impedia de continuar
estudando freneticamente a Medicina, minha saúde física. Não é uma reclamação,
a Medicina é antes de tudo um presente de Deus que eu pretendo aprender da
melhor maneira possível. No entanto, nada mais entrava na minha cabeça. Parei
de estudar, o que pra mim era mais preocupante do que estar doente em si. Foi
assim que eu me vi sentada em algum hospital, pela manhã bem fria de um final
de semana qualquer. Foi assim que me vi quase obrigada a observar a vida
enquanto esperava pelo atendimento.
Aos poucos fui
trazendo a percepção que há tanto me faltava, torcendo para que não tivesse
sido excluída em algum refinamento sináptico recente. Não fora. Percebi o ambiente
frio e as (outras) pessoas doentes dentro dele. Deixei meu coração ser tomado
pela empatia dos rostos alheios. Passei a pensar que existiam problemas maiores
do que não estar estudando naquele momento. E era verdade, pois os momentos
seguintes foram interrompidos por gritos de socorro que vinham de fora do
hospital. Eu pude ver dois homens que não eram do hospital entrando pelos seus
corredores procurando alguma maca. Eu também pude ver quando colocaram o homem
desacordado nela. Queria saber mais, era impossível pra mim, depois que entrei
na faculdade, não pensar no que aconteceria se eu já trabalhasse. Era um
sentimento comum pra mim. Ir aos hospitais e perguntar-me em segredo quem
seriam meus futuros colegas, se eu faria bem tal procedimento. Mas foi a
primeira vez que eu me fiz perguntas sobre as vidas dos outros seres humanos,
dos pacientes.
Uma voz fina interrompeu meus pensamentos me chamando
para a consulta. Eu fui; na verdade, não tinha nada se comparada com aquele
homem. A médica me ouviu com pouca ou quase nenhuma atenção – transcreveu o que
eu precisava na hora. Lá fui eu, andando pelos corredores atrás da sala de
medicação. Na minha busca, acabei entrando onde não devia e vi o homem antes
desacordado, agora consciente. Gosto de pensar que ele sorriu pra mim, apesar
de tê-lo visto apenas de relance. Enfim, achei a sala e enquanto era medicada
fiquei feliz pensando no possível sorriso. Essa é a história de como eu aprendi
mais sobre Medicina observando seres humanos do que os estudando pelos livros.