segunda-feira, 2 de maio de 2016

Medicina


Peguei-me mais uma vez sendo esvaída pela vida. Não que escrever não fosse mais prioridade, ainda é. Às vezes a vida é tão complicada de ser vivida que não nos sobra tempo para observá-la do jeito que ela merece, quanto mais para descrevê-la. No entanto, fui parada bruscamente pela única coisa que me impedia de continuar estudando freneticamente a Medicina, minha saúde física. Não é uma reclamação, a Medicina é antes de tudo um presente de Deus que eu pretendo aprender da melhor maneira possível. No entanto, nada mais entrava na minha cabeça. Parei de estudar, o que pra mim era mais preocupante do que estar doente em si. Foi assim que eu me vi sentada em algum hospital, pela manhã bem fria de um final de semana qualquer. Foi assim que me vi quase obrigada a observar a vida enquanto esperava pelo atendimento.

Aos poucos fui trazendo a percepção que há tanto me faltava, torcendo para que não tivesse sido excluída em algum refinamento sináptico recente. Não fora. Percebi o ambiente frio e as (outras) pessoas doentes dentro dele. Deixei meu coração ser tomado pela empatia dos rostos alheios. Passei a pensar que existiam problemas maiores do que não estar estudando naquele momento. E era verdade, pois os momentos seguintes foram interrompidos por gritos de socorro que vinham de fora do hospital. Eu pude ver dois homens que não eram do hospital entrando pelos seus corredores procurando alguma maca. Eu também pude ver quando colocaram o homem desacordado nela. Queria saber mais, era impossível pra mim, depois que entrei na faculdade, não pensar no que aconteceria se eu já trabalhasse. Era um sentimento comum pra mim. Ir aos hospitais e perguntar-me em segredo quem seriam meus futuros colegas, se eu faria bem tal procedimento. Mas foi a primeira vez que eu me fiz perguntas sobre as vidas dos outros seres humanos, dos pacientes.

 Uma voz fina interrompeu meus pensamentos me chamando para a consulta. Eu fui; na verdade, não tinha nada se comparada com aquele homem. A médica me ouviu com pouca ou quase nenhuma atenção – transcreveu o que eu precisava na hora. Lá fui eu, andando pelos corredores atrás da sala de medicação. Na minha busca, acabei entrando onde não devia e vi o homem antes desacordado, agora consciente. Gosto de pensar que ele sorriu pra mim, apesar de tê-lo visto apenas de relance. Enfim, achei a sala e enquanto era medicada fiquei feliz pensando no possível sorriso. Essa é a história de como eu aprendi mais sobre Medicina observando seres humanos do que os estudando pelos livros.